A UNIÃO ESTÁVEL E A OPÇÃO PELO REGIME PATRIMONIAL

A UNIÃO ESTÁVEL E A OPÇÃO PELO REGIME PATRIMONIAL

A UNIÃO ESTÁVEL E A OPÇÃO PELO REGIME PATRIMONIAL

Dispõe o Código Civil brasileiro, no art. 1.725, que na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

É certo, assim, que pode ser pactuado regime patrimonial diverso da comunhão parcial, quando os conviventes desejarem que a sua união seja regida por outro regime patrimonial. A lei não faz referência a que se faça o pacto por instrumento público ou particular, apenas exigindo contrato escrito.

Para o registrador gaúcho Mário Pazutti Mezzari, em brilhante explanação durante o III Encontro Estadual de Notários e Registradores do Rio Grande do Sul, realizado de 13 a 14 de março de 2009, em Bento Gonçalves, aconselha-se que seja utilizada a forma pública, por analogia à exigência de ato notarial para a escolha do regime de bens no casamento, conforme artigos 1.639 e 1.653 do Código Civil, sugerindo nomear-se a escritura como pacto patrimonial.

Mas, defende mais o avô da pequena Carolina; defende a possibilidade de registro desta escritura pública no livro 3 (registro auxiliar) do cartório de imóveis, à semelhança do que acontece com o pacto antenupcial.

Haverá que se concordar, por certo, com os ensinamentos do estudioso registrador, e vamos um pouco mais longe, em ousada interpretação, ficando a “deixa” para um aprofundamento futuro do tema, no sentido de que também por analogia às regras que regulam o casamento civil, se deva aplicar aos conviventes o regime da separação obrigatória de bens, quando ocorram as causas previstas no art. 1.641, incisos I, II e III, em combinação com o art. 1.523 do Código, no que couber, pena de nulidade do pacto.

Por: José Hildor Leal

Fonte: Notariado

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LGPD: A RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR NA ORIENTAÇÃO E DIRECIONAMENTO DA CONDUTA DO EMPREGADO

As orientações do empregador aos empregados devem ser claras e contínuas, com enfoque na proteção dos dados pessoais

Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), as empresas foram obrigadas a redobrar seus cuidados na coleta e tratamento dos dados e informações de seus clientes, empregados e stakeholders de forma geral.

Isso porque, no exercício de suas atividades, as empresas geralmente coletam e tratam informações ou dados de pessoas físicas, pelos mais variados motivos e finalidades, que podem ir desde o mero cumprimento de obrigações legais até estratégias mercadológicas ou planos e estudos para inovação de seus negócios.

Nesse cenário e segundo as determinações da LGPD, as empresas encontram-se na posição de controladores dos dados e, por isso, poderão ser responsabilizadas quando, no exercício das atividades de coleta e tratamento de dados pessoais, forem causados aos titulares dos dados, dano patrimonial, moral, individual ou coletivo, em violação à proteção de dados pessoais.

É fato que o Código Civil, em seu artigo 932, III, já previa a responsabilização do empregador pela reparação civil dos atos cometidos por seus funcionários (no exercício de suas funções). Todavia, com a LGPD, deve ser redobrado o cuidado no controle, treinamento e instrução dos operadores (funcionários ou terceiros), de modo a resguardar a privacidade dos dados coletados pelas empresas, além de conferir o adequado acesso e tratamentos dos referidos dados.

Note que os chamados operadores dos dados podem ser tanto terceiros contratados (ou subcontratados) como empregados próprios, além de exercerem funções nos mais variados segmentos de uma empresa: Recursos Humanos, Financeiro, Jurídico, Marketing, Operacional, Logística etc.

Por isso, para identificação e implementação de medidas mitigatórias efetivas é primordial a realização de um mapeamento do fluxo de dados na empresa, com vistas a identificar os operadores dos dados e os riscos relacionados à LGPD, em todos os setores e fases operacionais.

No caso de operadores empregados (CLT), a revisão dos contratos de trabalho é medida essencial, para que exista previsão expressa da obrigação do empregado em zelar pelo fluxo e tratamento adequado dos dados coletados, assegurando a privacidade dos titulares dos dados e evitando o vazamento destas informações.

Ainda, as orientações do empregador aos empregados devem ser claras e contínuas, com enfoque na proteção dos dados pessoais e mediante disponibilização de exemplos simples e diretos como: instruções sobre o bloqueio de sistemas e computadores quando o empregado se ausenta de sua mesa de trabalho, a importância dos cuidados com documentos que contenham dados e informações de pessoas físicas (fichas de registro, holerites etc), a proibição do compartilhamento de senhas e acessos aos sistemas, dentre outros.

Considerando, ainda, o momento da pandemia, em que muitos empregados estão em regime de teletrabalho (home office), é essencial que as empresas apresentem aos empregados orientações claras sobre o trabalho remoto, dos cuidados necessários e da conduta esperada de cada colaborador. Essas orientações devem estar compiladas em políticas acessíveis e treinamentos com avaliação de resultados, inseridos nos processos internos (controles) e nos sistemas de monitoramento.

A previsão das sanções nos contratos de trabalho também deve estar clara e amplamente divulgada. Infrações às políticas internas (e a legislação vigente) devem ser punidas com sanções administrativas (advertência ou suspensão) ou até mesmo a rescisão contratual com justa causa, por mau procedimento ou desídia.

Obviamente, as medidas de mitigação de riscos aqui comentadas devem estar inseridas na cultura da empresa, sob pena de não se obter o o engajamento necessário dos empregados (operadores) e, assim, não terem qualquer eficiência.

Nota-se, no fim das contas, que a LGPD exigiu que as empresas (controladoras) adotem medidas sérias de educação, orientação, treinamento, controle e fiscalização de seus empregados, com propagação da importância de um tratamento adequado dos dados, garantindo a preservação da privacidade pessoal.

Fonte: Migalhas

ASSESSORIA JURÍDICA

A procura da população pelos cartórios tem como intuito principal a solução de problemas, de maneira rápida e efetiva.

Nos últimos anos, as atribuições notariais e registrais evoluem em franca ascensão, provando que a sociedade realmente confia nos cartórios, os quais correspondem à confiança recebida.

Uma das principais razões de tal progresso é que as serventias extrajudiciais não se limitam a simplesmente “fazer aquilo que é pedido”; pelo contrário, buscam, quando preciso, ofertar ao cidadão uma alternativa juridicamente segura, muitas vezes desconhecida deste. Essa é a assessoria jurídica, silenciosa, mais presente na atividade tabelioa, inerente a todo o universo notarial e registral.

Um exemplo simples, mas corriqueiro, é o do indivíduo que comparece ao cartório visando ao reconhecimento de firma, mas, ao invés de utilizar a expressão “reconhecimento”, clama pela “autenticação” da assinatura. Nesse momento, a boa assessoria jurídica, singela, indagaria ao usuário o que ele realmente pretende, explicando que reconhecer firma é dizer que uma assinatura pertence a uma pessoa, e que a autenticação é o ato pelo qual se declara que uma cópia confere com o original, ambos com fé pública.

Inúmeros compradores batalham uma vida inteira pelo sonho da casa própria. No momento da escritura, por vezes estimulados por interessados envolvidos no negócio, comparecem ao cartório com pressa, desmunidos de algumas cautelas não obrigatórias, mas garantidoras de uma aquisição segura, como solicitar as certidões pessoais dos vendedores. Entram em cena novamente os tabeliães, discretos, informando o quão relevante é se certificar de que os vendedores não possuem determinados problemas em seu desfavor, os quais poderiam comprometer o esforço hercúleo de um trabalhador brasileiro.

A assessoria jurídica nem sempre é gritante, pelo contrário, é habitualmente imperceptível; os resultados da mesma, no entanto, são palpáveis nos lindos sorrisos de satisfação daqueles que são contemplados por ela.

Autor: Arthur Del Guércio Neto – Tabelião de Notas e Protestos em Itaquaquecetuba. Especialista em Direito Notarial e Registral. Especialista em Formação de Professores para a Educação Superior Jurídica. Escritor e Autor de Livros. Palestrante e Professor em diversas instituições, tratando de temas voltados ao Direito Notarial e Registral. Coordenador do Blog do DG (www.blogdodg.com.br).

Nota de responsabilidade:
As informações aqui veiculadas têm intuito meramente informativo e reportam-se às fontes indicadas. O Colégio Notarial Seção RS não assume qualquer responsabilidade pelo teor do que aqui é veiculado. Qualquer dúvida, o consulente deverá consultar as fontes indicadas.

Fonte: Notariado

RECONHECIMENTO DE FIRMA E AUTENTICAÇÃO DE CÓPIAS: BUROCRACIA OU SEGURANÇA JURÍDICA?

Há alguns dias, uma conhecida me contou que havia ido a um Órgão Público com seus documentos originais e cópias simples destes para encaminhar determinada solicitação e que o funcionário de tal Órgão disse que não era necessário apresentar os documentos originais, pois as cópias estavam bem legíveis.

Fiquei bastante preocupado com tal relato.

De fato, a Lei 13.726/18, sob o pretexto da desburocratização, dispensou a exigência de reconhecimento de firma e de autenticação de cópias perante os órgãos governamentais, nas esferas federal, estadual e municipal. De acordo com o referido texto legal, os órgãos públicos não podem mais exigir do cidadão a) o reconhecimento de firma, se o cidadão assinar o documento na presença do funcionário público ou se for possível a comparação das assinaturas com o documento de identidade do cidadão, e b) a autenticação de cópia de documento, se for possível a comparação entre a cópia e a via original pelo servidor público.

Vejam, a Lei dispensa a autenticação de cópia desde que esta esteja acompanhada e seja comparada com o seu original. A Lei não dispensa a apresentação dos originais caso as cópias estejam legíveis, como ocorreu na situação que minha conhecida me relatou.

Alguns podem dizer que tal situação é um caso isolado, não é a regra. E até pode ser. É realmente difícil aferir na prática se as cópias estão sendo devidamente conferidas pelos funcionários dos Órgãos Públicos. A questão é que esta situação nos leva a refletir em quanto a dispensa das cópias autenticadas, e também do reconhecimento de firma, pode prejudicar a segurança jurídica.

Em primeiro lugar, é importante salientar que os notários e seus prepostos tem expertise e treinamento na avaliação da veracidade de documentos e de assinaturas, pois, continuamente, frequentam cursos de grafodocumentoscopia com profissionais peritos em verificação e falsificações de documentos e assinaturas. Os notários e seus prepostos, através destes cursos, estão sempre acompanhando a evolução dos métodos dos falsários, a fim de conhecê-los e coibi-los.

Ademais, para realizar o reconhecimento de firma ou autenticação, os notários cumprem regras rigorosas previstas nas leis e nos códigos de normas dos Tribunais,  verificando, além da possibilidade de fraude, a vontade e a capacidade do autor da assinatura, no caso de reconhecimento de firma.  Novamente, assim como são necessários para a verificação da veracidade de documentos e de assinaturas, a expertise e o treinamento adequado são imprescindíveis para a verificação da capacidade e da vontade das partes.

Diante disto, fica a pergunta: sem desmerecer ninguém, será que os funcionários dos órgãos públicos recebem este treinamento, têm esta expertise? Será que os servidores públicos estão capacitados a averiguar a veracidade de um documento ou de uma assinatura, estão aptos a verificar a capacidade e a vontade das partes? Tomara que sim. Pois se não estiverem, a segurança jurídica está seriamente comprometida.

Ora, as tentativas de fraudes estão por todos os lados, basta dar uma breve olhada nas notícias. Somente para ilustrar, vejam estes exemplos:

  1. Laudo revela 2ª assinatura falsa em documento usado pela Andrade Gutierrez: A força-tarefa instalada na Prefeitura de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, para enfrentar a cobrança de R$ 480 milhões da Andrade Gutierrez (AG), referente a uma suposta dívida de 1982, detectou outra falsificação de assinatura. No mesmo documento que dá base ao pedido judicial da AG, juntamente com a assinatura falsa do ex-prefeito Osvaldo Franco, está a do ex-secretário da Fazenda José Dirceu da Silveira, que também recebeu a classificação de falsa. O procurador de Betim destacou que “num documento que pretende cobrar centenas de milhões, ninguém, ao longo de 30 anos de tramitação em juízo, cobrou a autenticação cartorial das assinaturas, mas aceitou uma simples fotocópia que deu como suficiente a tamanho valor.”[1]
  2. Banco indenizará mulher vítima de fraude por assinatura falsa: O juiz de Direito Maurício Lima de Oliveira, da 16ª vara de Relações de Consumo de Salvador/BA, condenou um banco ao pagamento de indenização para uma mulher que quase perdeu seu imóvel, em razão de dívida referente a serviço não contratado. O magistrado verificou que a mulher foi vítima de fraude, tendo sua assinatura falsificada.[2]
  • Banco responde por contrato de empréstimo com assinatura falsa, decide TJ-SP: Com base na súmula 479 do STJ, que estabelece que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros, a 24ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um banco a indenizar uma cliente que foi cobrada por contrato de empréstimo não reconhecido por ela. Perícia anexada aos autos constatou que a assinatura da cliente no contrato foi falsificada – o que não afasta a culpa do banco, segundo o relator, desembargador Walter Barone.[3]

Notem que, conforme comprovam as notícias acima, na maioria esmagadora das vezes, os prejuízos decorrentes de falsificações envolvem documentos em que não houve a chancela do tabelião através do reconhecimento de firma ou da autenticação de cópias.

Ou seja, sem reconhecimento de firma, sem autenticação de cópia, há menos segurança jurídica e, de consequência, mais prejuízos, mais ações judiciais, mais litígios, totalmente na contramão da tendência atual de desafogar o Judiciário, já incapaz de atender sua excessiva demanda.

Nas notícias trazidas, temos três exemplos de contratos que se tivessem a exigência do reconhecimento de firma, evitariam ou, no mínimo, intimidariam a ação dos falsários, evitando prejuízos às vítimas de seus atos.

É de se pensar, portanto, se a não exigência do reconhecimento de firma e da autenticação de cópia está a desburocratizar ou se está a criar um verdadeiro caos jurídico, remetendo a um Judiciário abarrotado de processos que poderiam ser evitados.

Tudo que o notário faz é trazer segurança jurídica, não burocracia. Reflita: é preferível perder alguns minutos num reconhecimento de firma ou autenticação de cópia ou perder anos de dor de cabeça e desgaste com um processo judicial para tentar reaver prejuízos decorrentes de uma falsificação? É sempre melhor prevenir do que remediar. É um clichê, mas é verdade.

A segurança jurídica proporcionada pela atuação do notário traz paz social, traz paz para você. Na verdade, a segurança jurídica é indispensável para uma Sociedade que quer prosperar economicamente, pois quanto maior segurança nas relações, menor risco, e, de consequência, maior o grau de investimento e maior a circulação de riquezas.

Desta forma, longe de ser uma burocracia desnecessária, o reconhecimento de firma e a autenticação de cópias, seja em meio físico ou eletrônico, são atos imprescindíveis para garantir que o Brasil prospere economicamente e volte a trilhar o caminho do desenvolvimento. Pense nisto!

[1] Disponível em https://www.otempo.com.br/opiniao/politica/laudo-revela-2-assinatura-falsa-em-documento-usado-pela-andrade-gutierrez-1.2260778. Acesso em 19.11.2019.

[2] Disponível em https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI307900,51045-Banco+indenizara+mulher+vitima+de+fraude+por+assinatura+falsa. Acesso em 19.11.2019.

[3] Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-set-03/banco-responde-contrato-emprestimo-assinatura-falsa. Acesso em 19.11.2019.

Autor: José Flávio Bueno Fischer – 1º Tabelião de Novo Hamburgo/RS. Ex-presidente do CNB-CF. Membro do Conselho Geral da UINL.

Fonte: Notariado

IMPACTOS PATRIMONIAIS EM CASO DE DIVÓRCIO OU FALECIMENTO – POR MIRIELLE ELOIZE NETZEL ADAMI

IMPACTOS PATRIMONIAIS EM CASO DE DIVÓRCIO OU FALECIMENTO – POR MIRIELLE ELOIZE NETZEL ADAMI

1- Introdução

O pacto antenupcial, ou contrato antenupcial, é um negócio jurídico bilateral de direito de família, sob a condição suspensiva da celebração do casamento, destinado a estabelecer regime de bens.

O contrato antenupcial, também denominado pré-nupcial, existe há séculos. Pesquisadores do Departamento de Arqueologia da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, encontraram na Mesopotâmia, atual território do Iraque, uma tábua do século IV a.C. com um detalhado acordo de casamento1.

No Brasil, nos termos do parágrafo único do art. 1640 do Código Civil, o pacto antenupcial tem que ser feito por escritura pública, sendo sua lavratura, assim, de atribuição exclusiva do Notário, conforme art. 6º da Lei nº 8.935/94. É indispensável o pacto quando os nubentes querem adotar o regime da comunhão universal, o da participação final nos aquestos, o da separação convencional ou ainda qualquer outro regime, posto que a doutrina e a jurisprudência admitem a criação de regimes diversos daqueles previstos no Código Civil. 

Muito já se escreveu sobre o pacto antenupcial2, mas existe pacto pós-nupcial? Se o pacto antenupcial é antigo, o mesmo não se pode dizer dos pactos lavrados após o casamento.

Na lei brasileira não se encontra menção a tal ato jurídico, no entanto a jurisprudência vem determinando sua lavratura em muitos casos, quando há alteração do regime de bens no curso do casamento.

1 Conforme informação de OSMAR FREITAS JR., na reportagem denominada: Os “postnups”, que alteram as regras acertadas antes do casamento, crescem nos EUA como forma de reduzir o número de divórcios. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR78614-6014,00.html>. Acesso em: 22 out. 2016.

2 Para aprofundamento, ver artigo de autoria de Letícia Franco Maculan Assumpção: O PACTO ANTENUPCIAL DE SEPARAÇÃO DE BENS QUANDO OS NUBENTES ESTÃO SUJEITOS À SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. Disponível em: < http://www.recivil.com.br/noticias>. Acesso em: 22 out. 2016. 

2- O pacto pós-nupcial

O pacto pós-nupcial é um acordo que rege o novo regime de bens vigente no casamento já celebrado, que no Brasil poderá ser feito após autorização judicial específica para alteração do regime.

Também poderia o pacto pós-nupcial corrigir um erro material existente no registro? Essa questão será examinada no decorrer deste artigo.

Nos Estados Unidos da América já são comuns os postnups, que vêm sendo usados para reduzir o número de divórcios, o que foi feito, por exemplo, pelo casal Michael Douglas e Zeta-Jones. Estatísticas da American Academy of Matrimonial Lawyers revelam que, em 1995, quando os pactos pós-nupciais começaram a ganhar popularidade, cada escritório de advocacia médio realizava aproximadamente cerca de dois contratos desses por ano. Mais recentemente, a média subiu para oito casos por ano1.

No Brasil essa tendência ao pacto pós-nupcial tem chamado atenção. No X Congresso Brasileiro de Direito de Família, houve palestra específica da advogada Viviane Girardi, presidente da Comissão de Jurisprudência do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, palestra denominada: “Mudança de regime de bens – efeito ex tunc e ex nunc – Pacto pós nupcial?”

Para a palestrante, a discussão é importante porque o Código Civil alterou o padrão da imutabilidade do regime de bens no casamento, quebrando um paradigma que sempre vigorou no Direito brasileiro.  “E essa discussão da possibilidade de alteração do regime de bens após o casamento diz respeito à autonomia das pessoas no âmbito das relações pessoais e patrimoniais, sendo relevante destacar os efeitos ex nunc ex tunc desse ato em face, também, dos reflexos que a alteração produz no âmbito da relação jurídica do casal e de cada um dos cônjuges com terceiros”. O pacto pós-nupcial, com a alteração do regime de bens, estabelece parâmetros que permitem que o casal promova, depois do casamento, um novo arranjo patrimonial. Ainda para Viviane Girardi: “As modificações que vêm ocorrendo no âmbito da família não permitem mais que as decisões sejam rígidas, porque as pessoas e as circunstâncias vão se modificando ao longo do tempo e, muitas das vezes, alterar o regime de bens é uma necessidade de determinados casais, inclusive para manterem os aspectos pessoais da relação”. 2

No Direito brasileiro, antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, a alteração de regime de bens na constância do casamento era vedada, mas, desde janeiro de 2003,  quando entrou em vigor o Código Civil de 2002, pode haver essa mudança, mediante autorização judicial3, em processo no qual devem figurar como partes ambos os cônjuges, que apresentarão pedido motivado e demonstrarão que a alteração não causará prejuízo a terceiros.

Qual a razão para a lavratura de pacto pós-nupcial se já é obrigatória decisão judicial autorizando a mudança do regime? Não deveria a própria decisão definir como seria o novo regime, vigente a partir de então? Há acórdãos que dispensam a necessidade de lavratura de pacto, posto que a própria decisão judicial pode fixar os parâmetros do novo regime de bens:

EMENTA: PEDIDO DE ALVARÁ JUDICIAL. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA LAVRAR ESCRITURA PÚBLICA DE PACTO ANTENUPCIAL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DA ALTERAÇÃO DE REGIME. DESNECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA. 1. Não tendo havido pacto antenupcial, o regime de bens do casamento é o da comunhão parcial sendo nula a convenção acerca do regime de bens, quando não constante de escritura pública, e constitui mero erro material na certidão de casamento a referência ao regime da comunhão universal. Inteligência do art. 1.640 NCCB. 2. A pretensão deduzida pelos recorrentes que pretendem adotar o regime da comunhão universal de bens é possível juridicamente, consoante estabelece o art. 1.639, §2º, do Novo Código Civil e as razões postas pelas partes são bastante ponderáveis, constituindo o pedido motivado de que trata a lei e que foi formulado pelo casal. Assim, cabe ao julgador a quo apreciar o mérito do pedido e, sendo deferida a alteração de regime, desnecessário será lavrar escritura pública, sendo bastante a expedição do competente mandado judicial. O pacto antenupcial é ato notarial; a alteração do regime matrimonial é ato judicial. 3. A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, de regra com efeito ex tunc, ressalvados direitos de terceiros. Inteligência do artigo 2.039, do NCCB. 4. É possível alterar regime de bens de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. Recurso provido. (SEGREDO DE JUSTICA) (Apelação Cível Nº 70006423891, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 13/08/2003)

Entretanto, o que tem ocorrido na maioria dos casos é a mera autorização judicial para alteração, deixando para que as próprias partes definam o novo regime que entendem melhor, por meio de escritura pública. Também aqui se vê a tendência à desjudicialização, que mais recentemente vem sendo denominada extrajudicialização, ou seja, a ampliação constante das atribuições dos titulares dos serviços notariais e de registro, no caso ora examinado, das funções dos tabeliães, também denominados notários.

É fato que a lei vem determinando que cabe a notários e registradores dar soluções jurídicas a problemas dos cidadãos quando não há conflito, de modo que o Judiciário possa se dedicar à sua real vocação, a solução de lides, o que encontra respaldo na confiança depositada nesses profissionais pelos cidadãos.

No que se refere ao pacto pós-nupcial, a atribuição vem sendo reconhecida pela doutrina1 e pela jurisprudência.

Além da utilização nos casos de alteração no regime de bens, importante ressaltar a possibilidade de utilização dos pactos pós-nupciais para casos de retificação de registro civil, em que houve erro material no registro específico, sendo apresentado nesse artigo um caso concreto em que houve aplicação desse entendimento.

3 Para aprofundamento, ver reportagem de OSMAR FREITAS JR., denominada: Os “postnups”, que alteram as regras acertadas antes do casamento, crescem nos EUA como forma de reduzir o número de divórcios. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR78614-6014,00.html>. Acesso em: 22 out. 2016.

4 Conforme notícia disponível em: < http://www.ibdfam.org.br/noticias/pagina/260>. Acesso em: 22 out. 2016.

5 O antigo Código Civil não autorizava a alteração do regime de bens escolhido por ocasião da celebração do casamento e determinava, em seu art. 230 que: “O regime de bens entre cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento, e é irrevogável”. Já o atual Código Civil, em seu art. 1.639, § 2º, estabelece ser “admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiro”. 

6 Sobre a necessidade do pacto, vide a doutrina de João Pedro Lamana Paiva, disponível em: <http://registrodeimoveis1zona.com.br/?p=218>, acesso em: 27 out. 2016. Segundo LAMANA: “Nosso entendimento é no sentido da exigência da escritura pública de pacto na ocasião da alteração de regime de bens autorizada pelo juiz competente quando for da substância do ato a escritura pública. São inúmeras as razões que levam a exigir a realização de novo pacto, senão vejamos: A escritura pública é da substância do ato nos pactos antenupciais, onde se convenciona acerca do regime patrimonial entre os cônjuges, e ocorrendo nulidade se não for obedecida a forma prevista em lei. Como ensina Washington Monteiro de Barros, em Curso de Direito Civil, vol. 2, Editora Saraiva: “Tal é a importância do pacto antenupcial, tanta ressonância tem na vida familiar, interessando não só aos cônjuges, como aos filhos e também a terceiros, que a lei exige a escritura pública, a fim de cercá-la de toda solenidade. a escritura pública representa assim condição essencial à existência do próprio ato.” Preenchidos os requisitos necessários para a homologação judicial (exigência de processo judicial, consensualidade, motivação e ressalva de direito de terceiros), deve ser elaborada nova escritura de pacto, para aqueles casos em que o regime alterado for diverso do regime legal e da separação obrigatória de bens, por ser da substância do ato tal forma. Nesse sentido, o art. 1.640, parágrafo único, do Código Civil de 2002 determina a possibilidade dos nubentes, optarem por qualquer dos regimes, devendo, contudo, quanto à forma, “reduzir-se a termo a opção pela comunhão parcial e fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas”. Ainda, nessa linha, o art. 1653 determina ser nulo o pacto se não for feito por escritura pública. Portanto, deve, após a homologação judicial ser elaborada escritura pública com o novo regime adotado após a alteração, sendo posteriormente averbada no Registro Civil de Pessoas Naturais e a seguir ser efetuado o registro, com base na certidão de casamento e na escritura, no Livro 3-Registro Auxiliar, no domicilio dos cônjuges e a respectiva averbação nas matrículas dos imóveis pertencentes ao casal. Reforça a exigência de escritura pública o princípio basilar do direito registral da publicidade, uma vez que o regime de bens adotado pelos nubentes deve ser de todos conhecido, e mais ainda, o regime alterado pelos cônjuges no transcorrer do matrimônio deve ser conhecido daqueles que com eles venham a negociar, como determina o art. 1.657 da Lei nº10.406/02 […] Ainda, o princípio da segurança jurídica deve ser observado, pois não há efeito prático contra terceiros a alteração do regime de bens a qual estes não possam vir a conhecer.  Foi nesse sentido que o art. 1.657 do Código de Normas Cíveis determinou a realização do registro em livro especial e a sua averbação correspondente. Logo, a simples menção em sentença não é eficaz para proteger de forma robusta o direito de terceiros frente a um casal, que em conluio, possa, eventualmente, querer alterar seu regime de bens na tentativa de lesar eventual credor. Ou acredita-se que a simples publicação de edital (conhecimento ficto) possa salvaguardar direito de outrem que contrata com casal em lugar diverso ao da publicação do edital? O art. 1657 da Lei 10.406/02 determina que não. […] A publicidade do novo regime adotado pelos cônjuges (alteração na constância do casamento) é tão importante quanto à publicidade do regime a ser adotado pelos nubentes (habilitação matrimonial), necessitando, portanto, da realização de escritura pública como prescreve a lei, como sendo a forma do ato, em regime de bens diverso do legal (art. 1.640, parágrafo único), e da separação obrigatória de bens, para preservar a essência da publicidade que é o resguardo de terceiros e dos próprios cônjuges, evitando assim, possíveis fraudes, minimizando eventuais demandas judiciais e aumentando a segurança jurídica das partes. Conclui-se, portanto, que a realização de escritura pública de pacto acerca do regime de bens adotado por ocasião de alteração pelos cônjuges vem a proteger e resguardar tanto o casal, como terceiros, preservando a publicidade e segurança jurídica exigidas quando da escolha do regime de bens, além de ser requisito de formalização de regime patrimonial determinado por lei (artigos 1.639, 1.640, 1.653 e 1.657 do Código Civil).”

3- Da Jurisprudência

Sobre o pacto pós-nupcial com objetivo de ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS, o Superior Tribunal de Justiça trouxe interessante definição no julgamento do RESP 1300205: “o pacto pós-nupcial […] em nossa legislação, depende de aprovação do Poder Judiciário para que seja válido.”

Abaixo se reproduz o referido RESP, com grifos no que há de mais relevante:

Processo

REsp 1300205

Relator(a)

Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

Data da Publicação

20/04/2015

Decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 1.300.205 – SP (2011/0300280-9)

RELATOR : MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. CASAMENTO CONTRAÍDO NA ESPANHA. REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS DE ACORDO COM A LEI DAQUELE PAÍS. VINDA PARA O BRASIL. DIVISÃO DE AQUESTOS. POSSIBILIDADE. PACTO PÓS-NUPCIAL.

1. Apesar de o casamento haver sido contraído no exterior e pelo regime da separação de bens, os bens adquiridos na constância da vida comum devem comunicar-se, exceto se houver expressa previsão de exclusão no pacto antenupcial ou pós-nupcial, este se validamente realizado.

2. A alteração do regime de bens após a celebração do casamento é admissível mediante autorização judicial.

3. Recurso especial conhecido em parte e provido parcialmente.

DECISÃO

Tratam os autos de ação de separação judicial litigiosa na qual a autora sustenta que se casou com o requerido em cerimônia religiosa no Brasil, mas o casamento civil foi realizado na Espanha, onde o casal viveu por algum tempo.

Logo que se mudaram para o Brasil, a relação tornou-se impossível, sendo o caminho da separação o mais indicado.

Propôs, então, a divisão dos bens, sustentando que o regime a ser considerado seria o da divisão parcial de bens.

A sentença homologou a separação e, em relação aos bens, decidiu que deveriam ser partilhados. Entendeu o julgador que, nada obstante o casamento civil sob regime de separação total de bens tivesse sido celebrado na Espanha, era viável a comunicação dos aquestos.

Reconheceu, então, que os bens móveis e imóveis podiam ser objeto de partilha, mas a matéria deveria ser suscitada em fase de execução de sentença.

Contudo, quanto à constituição e formação da sociedade filiada à Herbalife, afirmou-se no julgado que estava devidamente comprovado no processo a participação da autora na formação e constituição da sociedade, devendo também ela ser objeto de partilha. Toda a controvérsia que surgiu nos autos a partir da sentença restringiu-se à questão da partilha da referida empresa.

No acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de forma mais detalhada, encontram-se, no voto condutor, esclarecimentos de que o casamento, embora realizado na Espanha, fora devidamente transcrito no 1º Cartório de São Bernardo do Campo, além de registrado no Consulado-Geral do Brasil, fato que viabiliza o divórcio e a adoção do regime de bens ajustado pelo casal, o de separação total, o que não impede a comunicação dos aquestos, segundo legislação nacional.

Afirmou-se que, relativamente ao regime do Código de 1916, para os bens adquiridos na constância do casamento não se comunicarem por força do estatuído no art. 259 do Código Civil/1916, os nubentes deveriam ter feito consignar no pacto a incomunicabilidade dos aquestos.

Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados. Daí o recurso especial dirigido a esta Corte, […]

II – Art. 7º, § 4º, da LICC

No que tange às disposições do artigo indicado, vê-se, além da falta de prequestionamento, que o divórcio que o recorrente afirma ter ocorrido na Espanha não foi homologado no Brasil, pois não há nenhum procedimento de homologação de sentença estrangeira. As partes optaram por divorciar-se perante o governo brasileiro, sendo óbvio que as normas a serem adotadas são as nacionais.

III – Arts. 269, I e IV, e 263, XIII, do CC de 1916

A solução dada pelo acórdão a quo à questão encontra-se pacificada neste Tribunal, segundo o qual, mesmo que o casamento tenha sido realizado no exterior e pelo regime de separação de bens, os bens adquiridos na constância da vida comum devem comunicar-se. Confiram-se estes precedentes:

“CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO LIMITADO. DISSÍDIO NÃO APRESENTADO. INVENTÁRIO. CASAMENTO CONTRAÍDO NA ÁUSTRIA. REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS, CONSOANTE A LEI DAQUELE PAÍS, POR FALTA DE PACTO ANTENUPCIAL EM SENTIDO CONTRÁRIO. VINDA PARA O BRASIL. AQUISIÇÃO DE PATRIMÔNIO AO LONGO DA VIDA EM COMUM. FALECIMENTO DO CÔNJUGE VARÃO. DECLARAÇÃO DE BENS, CONSTANDO APENAS AQUELES EM NOME DO DE CUJUS. IMPUGNAÇÃO PELA FILHA DO PRIMEIRO CASAMENTO. AQÜESTOS. COMUNICAÇÃO. RESSALVA QUANTO AOS HAVIDOS PELO ESFORÇO EXCLUSIVO/DOAÇÃO/HERANÇA DA CÔNJUGE MULHER. LICC, ART. 7º, §

4º CC, ART. 259. SÚMULA N. 377-STF.

I. Apesar de o casamento haver sido contraído pelo regime da separação de bens no exterior, os bens adquiridos na constância da vida comum, quase à totalidade transcorrida no Brasil, devem se comunicar, desde que resultantes do esforço comum.

II. Exclusão, portanto, do patrimônio existente em nome da viúva, obtido pelo labor individual, doação ou herança, incorporando-se os demais ao espólio do cônjuge varão, para partilha e meação, a serem apurados em ação própria.

III. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido.” (REsp n. 123.633/SP, relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJe de 30.3.2009.)

“AGRAVO REGIMENTAL. SEPARAÇÃO LITIGIOSA. PARTILHA DE BENS. AQUESTOS. ESFORÇO COMUM. COMUNHÃO.

1.- No regime da separação total de bens, à mingua de cláusula excludente expressa no pacto antenupcial, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento pelo esforço comum dos cônjuges. Precedentes.

2.- Agravo Regimental improvido.” (AgRg no REsp n. 1.211.658, relator Ministro Sidnei Beneti, DJe de 3.5.2013.)

A questão de o regime de casamento ser o de separação total de bens foi decidida à luz dos documentos trazidos pelas partes aos autos e não pode ser revista por esta Corte, conforme óbice da Súmula n. 7/STJ.

Nesse mesmo sentido, apesar de insistir o recorrente em que houve alteração do pacto nupcial, para deixar claro que os bens adquiridos na constância do casamento também não se comunicaram, o Tribunal concluiu que se tratou de pacto pós-nupcial, que, em nossa legislação, depende de aprovação do Poder Judiciário para que seja válido.

De fato, conforme se observa do § 2º do art. 1.639 do Código Civil, a alteração do regime de bens é admissível mediante autorização judicial:

“Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

[…]

§ 2o É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.”

A decisão do Tribunal a quo não chegou a mencionar quais bens compõem ou não a divisão na forma dos artigos tidos por violados. Daí faltar-lhes o devido prequestionamento, atraindo a incidência da Súmula n. 282/STF para conhecimento do recurso especial.

IV – Art. 535, II, do CPC

Por fim, não houve infringência às disposições do art. 535, II, do Código Civil porquanto as questões suscitadas pelo recorrente como sendo omissas, na verdade, foram decididas, compondo o mérito da prestação jurisdicional. Apenas as conclusões a que chegou o julgador é que não são consentâneas com os interesses da parte.

V – Conclusão

Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e dou-lhe parcial provimento.

Brasília (DF), 08 de abril de 2015.

MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

Relator

4- A correção do erro material no Registro Civil das Pessoas Naturais


A Lei nº 12.100/2009 veio ampliar o rol de erros passíveis de correção pela via administrativa: qualquer erro que não exija qualquer indagação para a constatação imediata da necessidade de sua correção passou a ser objeto da retificação administrativa.

Antes da publicação da Lei nº 12.100/2009, o art. 110 da Lei de Registros Públicos somente admitia o processamento no próprio cartório da correção de erros de grafia.

Para facilitar a análise, segue abaixo quadro comparativo:

RETIFICAÇÃO DE REGISTRO – alteração na Lei de Registros Públicos pela Lei 12.100/2009:

REDAÇÃO ANTERIORREDAÇÃO PELA LEI 12.100/2009
Art. 110. A correção de erros de grafia poderá ser processada no próprio cartório onde se encontrar o assentamento, mediante petição assinada pelo interessado, ou procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas. (Renumerado do art. 111 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).
§ 1° Se qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público impugnar o pedido, o Juiz determinará a produção da prova, dentro do prazo de dez (10) dias e ouvidos, sucessivamente, em três (3) dias, os interessados e o órgão do Ministério Público, decidirá em cinco (5) dias.
§ 1º Recebida a petição, protocolada e autuada, o oficial a submeterá, com os documentos que a instruírem, ao órgão do Ministério Público, e fará os autos conclusos ao Juiz togado da circunscrição, que os despachará em quarenta e oito horas. (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975).
§ 2º Quando a prova depender de dados existentes no próprio cartório, poderá o oficial certificá-lo nos autos.
§ 3º Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do registro, mencionando o número do protocolo, a data da sentença e seu trânsito em julgado.
§ 4º Entendendo o Juiz que o pedido exige maior indagação, ou sendo impugnado pelo órgão do Ministério Público, mandará distribuir os autos a um dos cartórios da circunscrição, caso em que se processará a retificação, com assistência de advogado, observado o rito sumaríssimo.
Art. 110.  Os erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção poderão ser corrigidos de ofício pelo oficial de registro no próprio cartório onde se encontrar o assentamento, mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas, após manifestação conclusiva do Ministério Público.(Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).
§ 1o  Recebido o requerimento instruído com os documentos que comprovem o erro, o oficial submetê-lo-á ao órgão do Ministério Público que o despachará em 5 (cinco) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).
§ 2o  Quando a prova depender de dados existentes no próprio cartório, poderá o oficial certificá-lo nos autos. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).
§ 3o  Entendendo o órgão do Ministério Público que o pedido exige maior indagação, requererá ao juiz a distribuição dos autos a um dos cartórios da circunscrição, caso em que se processará a retificação, com assistência de advogado, observado o rito sumaríssimo. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).
§ 4o  Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do registro, mencionando o número do protocolo e a data da sentença e seu trânsito em julgado, quando for o caso. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

5- Do exame de caso concreto em que o Ministério Público autorizou a correção de erro material, determinando a lavratura de pacto pós-nupcial

Interessante caso concreto ocorreu em Minas Gerais. Um casal vivia em união estável e para reger o regime de bens durante a referida união, lavrou-se uma escritura pública de união estável, sendo escolhido o regime da separação de bens.

Logo em seguida os conviventes decidiram casar-se e, pensando que a escritura de união estável valeria como pacto antenupcial, a levaram ao Registro Civil para instruir o processo de habilitação para casamento.

No Registro Civil foi recebido o documento público de união estável, com opção pela separação de bens, como se pacto antenupcial fosse, tendo o processo de habilitação tido seu andamento sem qualquer questionamento, sequer pelo Ministério Público, órgão que fiscaliza, pela lei, o mencionado ato, sendo celebrado o casamento sob o regime da separação de bens.

O equívoco quanto ao instrumento público somente foi percebido ao ser apresentado o documento ao Registro de Imóveis, após a aquisição pelo casal do seu primeiro imóvel após o casamento.

Para resolver a situação, e como a vontade das partes sempre havia sido que o regime da separação de bens regesse seu casamento, foi solicitada a retificação de registro civil, nos termos do art. 110 da Lei de Registros Públicos, tendo sido requerido:

a) que permaneça o regime da separação de bens conforme Escritura Pública de União Estável anteriormente lavrada e certidão de casamento;

b) que seja autorizada a lavratura de pacto nupcial posterior ao casamento para regularizar tal situação.

O Ministério Público manifestou-se no seguinte sentido:

Trata-se de pedido de retificação no registro de casamento […]

O pedido foi devidamente instruído com os documentos de fls. 02/06.

Destarte, o Ministério Público não se opõe a realização de pacto nupcial, conforme requerido, a fim de que seja suprida a omissão no procedimento de habilitação de casamento, mantendo-se o regime da separação de bens na certidão de casamento.

Tendo em vista a manifestação do Ministério Público, foi lavrada a escritura pública de pacto pós-nupcial, privilegiando a vontade do casal.

6- Conclusão

O pacto pós-nupcial é uma realidade no Brasil e no mundo, apesar de não existir previsão legal do referido ato no Direito brasileiro.

Há vários motivos para se buscar um pacto pós-nupcial, devendo ser considerado que a longevidade da população faz com que as pessoas queiram adequar um casamento já celebrado há muitos anos ao momento em que estão vivendo, preservando o casamento e evitando conflitos, e assim protegendo essa instituição tão importante, que é a família.

No Brasil a doutrina e a jurisprudência já reconhecem a relevância do pacto pós-nupcial para definição do novo regime de bens após autorização judicial, considerando a tendência da desjudicialização ou extrajudicialização.

Mas também há a possibilidade de lavratura de pacto pós-nupcial para fins de retificação de registro civil, caso assim seja determinado pelo Ministério Público, no processo de retificação de registro civil previsto no art. 110 da Lei de Registros Públicos, como demonstrado no caso concreto relatado neste artigo.

A ideia, o norte, o rumo do Direito brasileiro tem sido no sentido de privilegiar a vontade, garantindo a segurança jurídica. Para isso devem atuar em conjunto: a população, o Poder Judiciário, os advogados e os notários e registradores.

* Letícia Franco Maculan Assumpção é graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1991), pós-graduada e mestre em Direito Público. Foi Procuradora do Município de Belo Horizonte e Procuradora da Fazenda Nacional. Aprovada em concurso, desde 1º de agosto de 2007 é Oficial do Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito de Barreiro, em Belo Horizonte, MG. É autora de diversos artigos na área de Direito Tributário, Direito Administrativo, Direito Civil e Direito Notarial, publicados em revistas jurídicas, e do livro Função Notarial e de Registro.

** Bernardo Freitas Graciano é sócio do Escritório Moisés Freire Advocacia. Com atuação e especialização na área de Direito Notarial e Registral em âmbito nacional. Foi Tabelião Substituto do Cartório do 9º Ofício de Notas de Belo Horizonte/MG, atuando na análise de processos extrajudiciais, desde 2001.

Fonte: Notariado

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